PROCESSO DE GASPAR RODRIGUES - Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc.12832

abril 13, 2021

PROCESSO DE GASPAR RODRIGUES - Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc.12832

Os progenitores de Manoel Dias Soeiro, mais conhecido pelo seu nome hebraico Menasseh ben Israel (מנשה בן ישראל), foram Gaspar Rodrigues Nunes (Joseph ben Israel) e Antónia Soeira (Rachele Sueira).

Quase tudo o que se sabe sobre os pais de Menasseh ben Israel decorre do processo da Inquisição de que seu pai foi alvo e, também de um ou outro comentário do próprio Menasseh sobre o assunto. Exemplo disso será a nota de 1 de março de 1639, que Menasseh ben Israel dirigiu ao seu amigo Dr. Johan van Beverwijck no final do seu livro De Termino Vitae:

“O meu pai Joseph ben Israel, de piedosa memória, foi privado de toda a sua propriedade pela Inquisição Espanhola, porque era judeu. Depois de ter sido três vezes submetido a torturas cruéis e ter perdido a sua saúde física, ele secretamente se retirou para estas províncias, juntamente com a minha mãe Rachele Soeira..." (tradução minha do inglês).

Do processo da Inquisição ficamos a saber que quando foi preso, a 5 de novembro de 1593, Gaspar/Joseph, natural de Beja e morador em Lisboa, tinha 35 anos e estava estabelecido como pregueiro, ou seja, vendia pregos. Aquando da sua prisão era casado com Filipa Rodrigues, presa pelo Santo Ofício em 1591 e que, para evitar o tormento terá mesmo denunciado o marido.

Pode ainda ler-se no processo que Gaspar Rodrigues tinha o estatuto de cristão-novo e foi, muito naturalmente, acusado de judaísmo.

Gaspar Rodrigues acabou sentenciado e, saiu no auto-da-fé de 23 de fevereiro de 1597. Mais concretamente foi condenado a abjuração em forma, cárcere e hábito penitencial perpétuo, penitências espirituais e da excomunhão maior em que incorreu seja "absoluto in forma eclesia".

Por morte da primeira mulher em 1598, volta a casar com a referida Antónia Soeira, mãe de Menasseh.

Procurei saber mais sobre Gaspar/Joseph pesquisando os registos paroquiais da cidade de Beja, partindo da pista de que teria nela nascido e os pais poderiam eventualmente ter casado por lá. Infelizmente os registos paroquiais das paróquias urbanas de Beja (Salvador, Santa Maria, Santiago Maior e São João Baptista) começam muito tardiamente. Seja como for, outros já o terão naturalmente tentado sem resultado.

Voltando ao assunto da referida residência obrigatória, que ficou estabelecida no bairro da Rua das Escolas Gerais, interessa saber que sob o nome de Escolas Gerais, a Universidade de Lisboa funcionou no Pátio dos Quintalinhos, no Paço do Infante Dom Henrique, antes de ser transferida para Coimbra em 1537, tendo gerado no local os topónimos Escolas Gerais, Rua das Escolas Gerais e Escadinhas das Escolas Gerais. Assim sendo, Gaspar Rodrigues viveria numa zona que até há bem pouco tempo albergava a Academia portuguesa.

Sobre estas artérias que existem até aos dias de hoje, com nomes determinados pelo Estudo fundado por El-Rei D. Dinis (ver link abaixo para mais detalhes) apura-se que: “as Escolas Gerais, artéria inclassificada que pertenceu às antigas freguesias de Santa Marinha e de S. Vicente [hoje sob administração das freguesias de Santa Maria Maior e São Vicente], que a compartilhavam, e a Rua das Escolas Gerais que pertenceu à antiga freguesia de S. Tomé, e durante algum tempo, pelo menos, também à do Salvador [hoje também na administração das freguesias de Santa Maria Maior e São Vicente].”

Uma vez mais, dei uma vista de olhos nos paroquiais das freguesias mencionadas e que, ao contrário do que aconteceu quando explorei os livros de Beja, apresentam já registos para as datas dos eventos que procurava: o óbito da primeira mulher e o casamento com a segunda. Claro que a busca foi em vão, no entanto, é sempre divertido pesquisar e a procurar.

Não conseguindo nada escrito sobre os antecedentes dos protagonistas desta história, resta-me um passeio pelo Bairro das Escolas Gerais, sempre giro e pitoresco, visitável nos dias que correm a pé ou a cavalo do famoso Elétrico 28.