Inquirição de Génere de Diogo Domingues Pablo


Há uns anos atrás, disse aqui que pensava que o ramo espanhol da família da minha avó paterna, com origem em Espanha (El Almendro), se teria fixado em Vale de Santiago em consequência das Invasões Francesas.
Nessa altura fazia também referência a um Presbítero Secular, de nome Diogo Domingues Pablo, que havia localizado no Vale, através de um registo de baptismo de um neto dos dois casais de espanhóis de que descendo, e que supunha estar de alguma forma  relacionado com o motivo pelo qual esses meus familiares se haviam fixado tão longe da zona fronteiriça. Presumia que quem vivia perto da fronteira e fugisse das Invasões se iria fixar, temporiamente do outro lado, perto da raia, na esperança de as coisas se acalmarem para depois regressar.

O documento que refiro em epígrafe, a que finalmente tive acesso, vem alvitrar outra explicação para a fixação desta gente em Vale de Santiago, indiciando que essa fixação é anterior às referidas invasões,que segundo algumas fontes, ocorreram por volta 1810 para a zona do El Almendro.
Veio também esclarecer a relação de parentesco entre os meus antepassados e o Presbítero Secular em causa, comprovando que foi ele quem se fixou no Vale, depois de terminados os seus estudos, porque lá viviam os seus pais, e se não todos, pelo menos alguns do seus irmãos. 

Como é que sei isto? Analisando a documentação que constitui o processo de inquirição de génere.
                                                                                                                                                                Este processo de habilitação começa com a declaração de recepção de uma petição do interessado, na cidade de Beja, na Casa da Câmara Eclesiástica, com despacho do Arcebispo que admite o mesmo de "Prima Tonsura de Ordens Menores", mandando que se proceda às diligências inerentes à referida petição.

De seguida há um documento introdutório com a filiação do requerente e respectiva biografia básica. Logo aqui, ao conhecer a identificação do requerente se estabelece sem margem para dúvidas que o requerente é filho do casal que está na origem do meu ramo Domingues Pablo.
É também desta forma que fico a saber que este meu antepassado estudou numa das primeiras universidades privadas da Europa, em que se estudava direito, teologia e filosofia. É dito no documento que o requerente fez um curso de três anos de Filosofia e outros três de Teologia Dogmática no Colégio de Santo Monte de Granada. Mais se refere que ele se julga com estudos e vocação para ser admitido às ordens, visto estar escuso de recrutamento.
Segue-se o comprovativo de escusa da autoria do Sargento de Ordenanças da Vila de Santiago do Cacém. Assim  fico a saber que os pais se naturalizaram portugueses e que a razão da dispensa prende-se com o facto de ter sido criado em um colégio, onde se aplicou nos estudos. ( A questão que se impõe aqui é saber quem patrocinava estes estudos? Os pais? Algum parente/protetor abastado?)                                                                                                     
Nada é deixado ao acaso, e é apensado um outro documento que comprova que o seu pai se naturalizou português a 3 de Julho de 1801, era D. João VI Príncipe Regente.  Em Colos, a 8 de Maio de 1812 é entregue, ao progenitor, esse comprovativo que, presumo que para juntar ao processo, e que o pai dele assina como tendo recebido. (Quais as regras à época para obter a nacionalidade portuguesa?)

Uma preciosidade, ter finalmente algo escrito e em boa caligrafia por um antepassado.


O padre da paróquia, João da Silva, atesta que os pais do Diogo estão naturalizados e são moradores há mais de 20 anos no Vale. A data deste documento é de 13 de Maio de 1812. Assim e fazendo as contas, vivem, pelos menos desde 1792, no Vale de Santiago o que exclui a hipótese de fuga de El Almendro devido às Invasões Francesas.

No entanto, pelo último registo de baptismo de um irmão do Diogo, Juan, que ocorreu em 1794 ainda em El Almendro, se pode ver que há algum exagero nas declarações do padre. De qualquer forma foi antes das Invasões porque depois desta data não há mais irmãos nascidos no El Almendro, e a irmã mais nova de que descendo, aparece em vários assentos como tendo nascido já no Vale, logo estarão por lá há uns 18 anos.

Porque que se estabeleceram então em Portugal?

Num documento do Bispado, datada de Julho de 1812, dirigida ao pároco em que se diz que"se acha sentido a Prima Tonsura e Ordens Menores" e que se solicita ao padre que investigue o habilitando quanto à geração e vida, começa a desenhar-se a resposta a esta questão.

A 18 de Agosto de 1812, o pároco do Vale, elenca o rol de testemunhas de vida e o rol de testemunhas de génere a serem inquiridas que garantirão que são de boa geração e que não cometeram crimes de lesa majestade. O interesse das declarações das testemunhas é relativo, as respostas são repetitivas e pouco extensas, mas revelam no entanto o grupo sócio-económico em que estão inseridas: todos eles homens, todos eles com mais de 50 anos, casados  e que declaram viver de seu negócio assim como o pai do habilitando e que sabem pelo menos assinar, espalhados geograficamente por Vale de Santiago, Panóias e até mesmo. na cidade de Beja. De que negócio se trataria não faço a mínima ideia, poderiam ser por exemplo feirantes.

No caso concreto deste processo de habilitação, não veio desvendar nomes de antepassados que me permitissem prosseguir as pesquisas em Espanha. Já tinha, inclusivamente conseguido a informação genealógica que consta nos documentos, através de um investigador espanhol, que se revelou ser meu primo. Veio sim, confirmar essa informação que me havia sido facultada através dos índices compilados por esse meu parente. Veio esclarecer e dar mais informações sobre as motivações da fixação fora do território espanhol, assim como produzir um retrato mais próximo do que seria a situação sócio-económica destes meus antepassados.
Apesar de lançar a grande questão/confusão sobre quem seria o mecenas que proporcionou ao Diogo os estudos superiores, numa universidade tão cara e distante, tanto de El Almendro como do Vale de Santiago, sei que posso avançar com mais segurança nas pesquisas deste meu lado espanhol. Resolvi, então, pedir as duas dispensas matrimoniais de que tenho conhecimento, e que preciso, para o Bispado de Sevilha. Infelizmente continua a ser quase impossível pesquisar em Espanha. Vamos ver como corre.


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